Ermance Dufaux de La Jonchère (Cambrai, França, 8 de março de 1839 - Suresnes, França, 3 de março de 1915) foi uma notável médium precoce, autora de extraordinárias obras literárias, que muito contribuiu com Allan Kardec para a codificação do Espiritismo, inclusive como médium da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas (SPEE), da qual foi sócia-fundadora juntamente com seu pai; de forma especial, colaborou com a edição revisada de O Livro dos Espíritos. De sua produção mediúnica, destacam-se as obras História de Luís XI ditada por ele mesmo (1853) e História de Joana d’Arc ditada por ela mesma (1855). Entre as entidades espirituais que se valeram dos seus dotes mediúnicos, destaca-se o Espírito de são Luís, patrono da SPEE. A senhorita Dufaux foi, portanto, uma das maiores figuras entre os espíritas da primeira geração.
Tradicional ilustração de Ermance Dufaux (1839-1915)
Ermance Dufaux nasceu no ano seguinte ao casamento de seus pais: Jacques Dufaux de La Jonchère e Léonide Groslevin, que originalmente lhe deram o nome de Hermance, conforme consta nos seus registros de nascimento e de óbito. Este nome é o mesmo topônimo de um rio que corre na fronteira entre a França e a Suíça, bem como de uma comuna suíça, às margens deste mesmo rio. Atribui-se a origem deste prenome à forma feminina de Hermann, um prenome comum nos povos germânicos; mas muito faz lembrar Hermes (Hermês, em francês), uma das divindades da mitologia grega (equivalente a Mercúrio, nos mitos romanos), caracterizado como o mensageiro e intermediário entre os deuses do Olimpo e a humanidade, além de patrono da magia e da adivinhação; portanto, uma espécie de médium. Entretanto, por uma razão ora ignorada, a menina assinava suas obras com a grafia Ermance — sem a letra inicial H — que é a forma que adotamos, por estar consagrada no movimento espírita.
Ela é natural de Cambrai, uma comuna francesa na região norte do seu país; teve uma irmã mais nova: Marguerite Marie Dufaux, nascida em 1851. Seu pai trabalhava numa função estatal equivalente a fiscal da receita (“contrôleur de contributions directes”, segundo o registro de nascimento de Ermance).
Ocorreu com a menina Ermance o mesmo que com outros tantos, especialmente em sua época, quando eclodia a extraordinária fenomenologia do Espiritualismo Moderno: o desabrochar da mediunidade. Precocemente, a jovenzinha recebia a visita de Espíritos que escreviam ou ditavam mensagens.
Canuto Abreu em sua obra O Livro dos Espíritos e sua Tradução Histórica e Lendária — que, como o próprio título diz, se trata de uma mescla de fatos (dados históricos) com ficções (lendas) —, conta que o pai da menina a levou a um médico em Versailles, Dr. Clever De Maldigny, que a diagnosticou portadora de um distúrbio mental, fruto de uma “epidemia”, muito contagiosa, oriunda da América. Uma semana depois, os Dufaux foram orientados pelo famoso magnetista marquês de Mirville, que melhor orientou a família sobre as faculdades psíquicas de Ermance após submetê-la a uma prova, que então psicografou uma mensagem de são Luís:
Então com apenas dezesseis anos de idade, em 1853, Ermance vê sua obra psicográfica ser publicada pela primeira vez: Confissões de Luís XI. História da sua Vida Ditada por Ele Mesmo. Todavia, o órgão sensor do governo francês acabou cassando a obra por considerá-la subversiva para a ordem pública.
Segundo Canuto Abreu, a fama da jovem médium correu o país ao ponto de chamar a atenção do próprio imperador da França, Napoleão III, que a teria visitado em Fontainebleau e, na ocisão, recebido uma mensagem do seu tio, Napoleão Bonaparte, cujo estilo do texto foi prontamente reconhecido. Desde então o monarca teria ficado mais sensível ao espiritualismo, dando mais confiança à moça de poderes psíquicos.
Em 1855, dois anos depois da primeira publicação, a jovem assina o livro História de Joana D'Arc ditada por ela mesma, obra notável de que futuramente Allan Kardec tanto fará propaganda.
Não obstante os evidentes recursos da jovem médium, a desconfiança rondava a vizinhança dos Dufaux; havia quem acusasse que a produção mediúnica de Ermance fosse na verdade de seu pai, acusação rebatida pelo editor da Revista Espiritualista, Z. J. Piérart, conforme um artigo de outubro de 1861:
Um exemplo público dos ataques à Ermance e pura demonstração de ignorância e preconceito contra a mediunidade e o Espiritismo, o historiador Henry Abel (1796-1861) escreveu em seu jornal Gazette du Midi de Marselha:
Diz Canuto Abreu que Ermance e o Sr. Dufaux conheceram Allan Kardec no dia do lançamento de O Livro dos Espíritos, em 18 de abril de 1857; a partir daí, eles passariam a integrar as sessões do grupo mediúnico dirigido pelo codificador espírita, na própria residência dos Kardec.
É fato que a família Dufaux entrou no círculo íntimo do pioneiro espírita logo após o lançamento da obra inaugural da nova doutrina. Primeiramente, sabemos da participação de Kardec numa sessão mediúnica na casa do Sr. Dufaux em 15 de novembro de 1857, conforme suas anotações pessoais publicadas em Obras Póstumas, justamente em seguida ao trecho que fala da dispersão das irmãs Baudin (as duas principais médiuns da primeira edição de O Livro dos Espíritos): era preciso contar com novos medianeiros, e então a donzela vinda de Cambraia parecia satisfazer a essa necessidade.
Adiante, as anotações pessoais de Kardec dão conta de que ele criou, no segundo semestre de 1857, um grupo experimental em sua casa, reunindo-se às terças-feiras, tendo a senhorita Ermance como a principal médium. Com a frequência excedendo e muito as acomodações da casa, ocorreu a ideia da criação de uma instituição, devidamente formalizada e instalada num espaço apropriado para as reuniões de estudo. Além dos custos operacionais para esta fundação, era preciso cuidar da burocracia. Nesse sentido, especialmente, o pai de Ermance teve papel preponderante, como atesta Kardec:
O empreendimento foi encorajado pelo Espírito de são Luís, mediante as faculdades psíquicas de Ermance.
Assim, foi regulamentada a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, em 1 de janeiro de 1858, instalada numa sala alugada no Palais-Royal, inicialmente na galeria de Valois, e logo depois transferida para uma sala maior, na Galeria Montpensier do mesmo complexo. Portanto, Jacques Dufaux e sua filha foram membros-fundadores da SPEE, e são Luís foi declarado protetor espiritual da Sociedade, com assídua frequência, especialmente se comunicando através da jovem médium de Cambrai.
Representação gráfica de uma sessão na SPEE (créditos: CCDPE-ECM)
Antes mesmo da fundação da SPEE, também por intermédio de Ermance, são Luís ainda vai sancionar o projeto de Kardec para a publicação da Revista Espírita, que se realiza naquele mesmo mês de janeiro de 1858. Para tanto, o amigo espiritual de Ermance dita até conselhos sobre as matérias a serem publicadas na revista:
Na referida revista, Kardec vai fazer diversas menções à jovem médium, a começar pela primeira edição, num artigo sobre o livro História de Joana d’Arc ditada por ela mesma; quando o editor então faz uma defesa dos dotes mediúnicas da senhorita Dufaux:
Na edição seguinte (fevereiro, 1858), Ermance aparece novamente citada como a médium de uma comunicação assinada por são Luís, ditando conselhos aos avarentos, cujo trecho recortamos como mostra da elevação da mensagem:
No terceiro mês daquele periódico, Kardec anota uma curiosidade sobre ela: “A princípio, era excelente médium psicógrafa, escrevendo com grande facilidade; pouco a pouco se tornou médium falante e, à medida que essa nova faculdade se desenvolvia, a primeira enfraquecia; hoje, escreve pouco ou com muita dificuldade, mas, o que há de estranho é que, falando, sente necessidade de ter um lápis à mão, fingindo que escreve; é preciso uma terceira pessoa para registrar suas palavras, como as da Sibila.”
Em algumas edições da sua revista Kardec publicou um ‘Boletim da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas’, descrevendo os diálogos mediúnicos, anotando o nome do Espírito comunicante e do médium, ou pelo menos as iniciais ou a primeira letra do sobrenome; com isso, é possível que a médium citada como “Srta. L. J...” (edição de dezembro de 1859 e setembro de 1860) refira-se a “La Junchère”, portanto, a Ermance Dufaux de La Junchère.
A última menção da revista kardequiana à senhorita Dufaux foi no artigo ‘Remédio dado pelos Espíritos’, da edição de novembro de 1862, trazendo a receita para a confecção de uma pomada que ela havia enviado à SPEE com autorização para a devida publicação. Kardec conta que Ermance tinha estado adoentada com um mal na perna que resistia a todos os tratamentos já sugeridos; ela então, “Cansada de ter empregado inutilmente tantos remédios”, pediu socorro ao seu Espírito protetor, que lhe indicou uma antiga pomada que seu tio (já falecido) havia trazido dos Estados Unidos há muito tempo atrás; Ermance tinha a lembrança desse unguento e de sua maravilhosa eficácia para toda sorte de chagas ou feridas, porém retrucou ao seu amigo espiritual que a receita dessa pomada havia se perdido; mas ele replicou que lhe ditaria a fórmula, como de fato o fez, e Kardec a reproduziu na sua revista, acrescentando o resultado obtido por Ermance: “Tendo seguido a prescrição, em poucos dias a perna da Srta. Dufaux estava cicatrizada e a pele restaurada. Desde então se sente bem, não lhe sobrevindo nenhum acidente. Felizmente a sua lavadeira também foi curada de mal idêntico.”
Após isto, o sobrenome Dufaux foi mencionado na revista referente a abril de 1863, no artigo ‘Subscrição ruanesa’, numa lista de contribuições para uma campanha de arrecadação de fundos em favor dos operários de Rouen, iniciada por Allan Kardec na edição de janeiro daquele mesmo ano. Muito provavelmente, portanto, deve se tratar da senhorita Dufaux ou de seu pai.
Além das excelentes mensagens publicadas na Revista Espírita, a mediunidade de Ermance Dufaux marca presença na Codificação Espírita. Como nem sempre Kardec assinalava o nome do médium das comunicações transcritas em suas obras, é provável que várias delas tenha passado pela psicografia ou psicofonia da moça; mas é certa a sua participação em pelo menos duas passagens no livro O Céu e o Inferno: na primeira, temos a transcrição do diálogo com o endurecido Espírito da ‘Rainha de Oude, falecida na França’, diálogo esse originalmente publicado na Revista Espírita de março de 1858, constando o nome da médium:
A outra passagem em que o intermédio de Ermance é garantido é a do Espírito de Lemaire, um dos “criminosos arrependidos”, cuja história foi reproduzida também na periódico kardequiano de março de 1858; ele foi condenado juntamente com seu bando acusado de cinquenta roubos, três assassinatos e dois incêndios, pelo que foi decapitado em 1857. Então na vida espiritual, resignado, ele descreveu sua falência na dita reencarnação:
Além disso, estima-se que Ermance tenha sido uma das principais médiuns a contribuir com a revisão de O Livro dos Espíritos para a sua segunda edição, publicada em 1860; Canuto Abreu assevera esta informação em seu livro aqui mencionado.
A primeira obra notável da médium Ermance Dufaux foi Confessions de Louis XI, Histoire de sa vie dictée par lui-même — ou, Confissões de Luís XI, História de sua vida ditada por ele mesmo — recebida quando ela tinha apenas catorze anos e lançada dois anos depois, em 1853, e que, como já sabemos, foi censurada pelo governo. Posteriormente essa proibição foi revista e sua publicação foi autorizada, como se deu, por exemplo, no periódico lionês La Vérité, dirigido por Evariste Edoux, dividida em trinta e oito artigos, de maio de 1864 até maio de 1865, sob o título ‘História de Luís XI ditada por ele mesmo’ (no original em francês: Histoire de Luis XI dictée par lui-même). Antes disso, Allan Kardec havia reproduzido alguns trechos de seu grosso volume nos exemplares da sua revista correspondentes a março, maio e junho de 1858. Assim ele comenta sobre a referida obra:
Em Histoire de Jeanne D’Arc, dictée par elle-même — ou, História de Joana D'Arc Ditada por Ela Mesma — publicada em Paris no ano de 1855, Ermance dá voz à heroína francesa, famosa justamente por também ser dotada de mediunidade. Kardec fez inúmeros elogias a este trabalho, inclusive anunciando com entusiasmo a reedição de 1860, pela Livraria Ledoyen (a mesma que comercializou a primeira edição de O Livro dos Espíritos, em 1857). Nesta oportunidade, o codificador do Espiritismo prestou seu depoimento:
Esta obra sobre a História de Joana d'Arc foi um dos títulos que constava no lote das trezentas obras espíritas que Kardec havia remetido para seu amigo livreiro Maurice Lachâtre a fim de serem comercializadas na Espanha e que acabaram confiscadas pela Inquisição católica e então queimadas no famoso Auto de Fé de Barcelona, no dia 9 de outubro de 1861. A leitura deste livro também é sugerida por Kardec no Catálogo Racional das obras que podem servir para formar uma Biblioteca Espírita, classificada entre as “Obras diversas sobre o Espiritismo”.
Srta. Dufaux conta a História de Joana d'Arc
Nos avisos da Revista Espírita de abril, 1859, o editor dá a entender que a médium também teria intermediado a autobiografia de são Luís (Luís IX), dizendo: “Lembramos aos nossos leitores que a História de Joana d'Arc está completamente esgotada; que a vida de Luís XI, bem como a de Luís IX, ainda não foram publicadas. Esperamos que o sejam um dia e, então, será para nós um prazer anunciá-las em nossa coleção. Até lá qualquer pedido dessas obras não alcançará o seu objetivo.” No entanto, não temos conhecimento se tal publicação se efetivou; o mesmo se aplica a uma possível autobiografia do rei Charles VIII.
Também dividida em capítulos, temos a ‘História militar d'Eugène de Beauharnais’, vice-rei da Itália, publicada no jornal Le Sauveur des Peuples, dirigido por Armand Lefraise, de Bordeaux, entre as edições de agosto de 1864 e maio de 1865.
Por uma razão que desconhecemos, Ermance e seu pai deixaram de frequentar a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas pelo menos em 1859; como consequência, seu Espírito amigo e patrono da SPEE, são Luís, passou a se comunicar através de outros médiuns, principalmente o Sr. Rose, o Sr. Collin, a Sra. Costel e a Srta. Huet. Uma possível justificativa para sua retirada pode ter sido o seu problema de saúde, relatado na comunicação que ela enviou a Kardec em 1862, juntamente com a fórmula da pomada recuperada pelo seu Espírito protetor. Doravante, não teremos mais informações de qualquer nova produção mediúnica de Ermance.
Como ela não contraiu matrimônio, é muito plausível que tenha continuado a morar com os pais em Paris. Ali mesmo, na Cidade Luz, o Sr. Dufaux desencarnou em 1876, aos setenta e um anos, conforme sua certidão de óbito, residindo na Rua Vaneau, muito próximo da Vila de Ségur, onde então habitava a viúva Kardec (Amélie Gabrielle Boudet). Sua mãe faleceu numa data não muito distante, em 1878, ano em que vem a lume um livro publicado com a assinatura de Ermance Dufaux, mas não mediúnico: Le savoir-vivre dans la vie ordinaire et dans les cérémonies civiles et religieuses [Etiqueta na vida cotidiana e nas cerimônias civis e religiosas]. Pois então, ei-la escritora!
Como própria autora, ela vai investir em mais livros: Ce que les maîtres et domestiques doivent savoir [O que senhores e funcionários domésticos precisam saber], de 1884. L'Enfant, hygiène et soins maternels pour le premier âge, à l'usage des jeunes mères et des nourrices [A criança, higiene e cuidados maternos na primeira idade, para uso de jovens mães e babás], de 1886; e Traité pratique de la broderie [Tratado prático de bordado], de 1888.
Além disso, a obra Les maronites et la France [Os maronitas e a França], publicada em 1860 pela livraria de Édouard Dentu (que também imprimiu obras de Kardec), curiosamente não traz o nome do autor; contudo, o nome de “Hermance Dufaux” aparecerá no 11° tomo do Catálogo da História da França (da Biblioteca Nacional da França) como a credora desta autoria, conforme informação do Sr. Barbier (autor de um dicionário de obras anônimas de 1875). Maronitas são cristãos da igreja católica de rito oriental estabelecida no Líbano, conhecida como Igreja Siríaca Maronita de Antioquia. Interessante observar ainda que este lançamento do livro não é comentado por Allan Kardec na Revista Espírita.
Segundo o volume de 1898 do Boletim da Sociedade Literária e História de la Brie, fundada em Meaux no ano de 1893, a Srta. Dufaux de la Jonchère, residente em Mont-Valérien, era um dos membros correspondentes daquele círculo literário; o mesmo boletim, inclusive, destaca alguns poemas da mencionada sócia, por exemplo, Cidade Luz, recitado naquela sociedade por Paul Mounet, numa seção solene em 20 de junho de 1897.
Não é absurdo pensar que ela tenha ido morar com sua Irmã, Marguerite, que se casou em 1883 e manteve o endereço da mãe, em Paris (na rua des Beaux Arts, 6), de acordo com a certidão de seu casamento; mas em algum momento Ermance acabará se mudando para o número 18 da Rua du Fécheray em Suresnes, uma comuna pertencente à região metropolitana da capital francesa, pois este é o endereço que consta no seu registro de óbito, em 3 de março de 1915.
Não foi pouco a contribuição de Ermance Dufaux de La Jonchère para o Espiritismo; além de emprestar seus dons mediúnicos diretamente a Allan Kardec em face da sistematização da Doutrina Espírita, inclusive pela intermediação de comunicações importantes para as obras básicas da codificação, bem como de seu papel na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, há que se salientar o próprio desafio de assumir o título de médium numa época em que o diagnóstico comum para pessoas tais era o de demência, histeria ou perturbações outras — não bastasse o desafio de ser uma mulher, jovem e solteira.
A mademoiselle Dufaux, por sua vez, parece ter se habituado tanto ao mediunato que não deixou nenhum esboço de inquietude ou queixa, mesmo ante as críticas e desconfianças sobre suas faculdades psíquicas — talvez em função do apoio paterno, que igualmente tem grandes méritos anotados na galeria dos espíritas pioneiros.
Nenhum registro histórico conhecido desabona a integridade moral de Ermance, o que é um traço biográfico expressivo, especialmente considerando a corriqueira exploração financeira da mediunidade em sua época. Por isso, seu nome está consagrado entre os maiores personagens da primeira hora do Espiritismo.
Na Revista Espírita de março de 1858, tratando do caso do Espírito Lemaire, Kardec coloca uma nota contendo um diálogo com outra entidade invisível, Raquel (Rachel, em francês), que alega ter fortes laços espirituais com a médium da sessão (Ermance), quem ela descreve como alguém que “jamais deixou inteiramente o mundo dos Espíritos”, acrescentando que quando evocada por esta amiga, ela vem imediatamente. Segundo a fanpage Variações Intuitivas, esta entidade é a que animou Élisabeth-Raquel Félix (1821-1858), uma cantora e atriz francesa que alcançou considerável sucesso, e que muito provavelmente teve algum contato com Rivail (Allan Kardec, antes do Espiritismo) enquanto ele trabalhou como administrador de teatros. Rachel era de uma magnética beleza e doçura na voz, embora de temperamento “extrovertido e combativo”; adoentada, foi tratada até seu falecimento pelos cuidados do dramaturgo Victorien Sardou, espírita e amigo de Kardec. Os esforços dos jornais da época para publicar fotos dela em seu leito de morte levaram à introdução dos direitos de privacidade na lei francesa. A Avenue Rachel, em Paris, que termina no Cemitério de Montmartre, foi rebatizada em sua homenagem em 2 de agosto de 1899. Em vida, foi espiritualista e frequentou sessões mediúnicas, inclusive tendo premonição da própria morte enquanto encenava uma peça. Então desencarnada, também se manifestou na SPEE através da médium Sra. Costel em 30 de novembro de 1860 (Revista Espírita de janeiro de 1861; ‘Boletim da SPEE’). Em dezembro de 1874, ditou à médium Madame A. Krell uma tocante mensagem intitulada “Os artistas e seu papel da sociedade”, predizendo que “Um dia chegará em que os sentimentos mais depurados ensejarão aos artistas uma nobre tarefa, até lá, fazei votos para que os gostos saiam da lama atual, para que o belo seja compreendido e o bem seja apreciado; aí então nossos louros serão verdadeiras coroas e nosso trabalho uma felicidade.”
No Brasil, algumas obras foram publicadas com autoria atribuída ao Espírito Ermance Dufaux, sendo a mais notária delas Reforma Íntima Sem Martírio, por Wanderley Oliveira, lançado em 2023 com o selo da Editora Dufaux. Assim diz certo trecho da Introdução desta obra:
No filme Kardec, a história por trás do nome, dirigido por Wagner de Assis e lançado em 2019, a personagem Ermance Dufaux aparece em destaque, sendo interpretada pela atriz Louise D'Tuani.
Ermance Dufaux (Louise D'Tuani) no filme Kardec (2019)
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